Os principais sindicatos agrícolas pediram, nesta quinta-feira (1º), a suspensão dos bloqueios na França, em resposta aos anúncios do governo para acabar com duas semanas de protestos agrícolas que agora se espalham por outros países da União Europeia.

“Diante de tudo o que foi anunciado, apelamos às nossas redes (…) para suspenderem os bloqueios e empreenderem uma nova forma de mobilização”, declararam em coletiva de imprensa os dirigentes da FNSEA, Arnaud Rousseau, e da Jovens Agricultores, Arnaud Gaillot.

Minutos antes, o primeiro-ministro, Gabriel Attal, havia apresentado uma terceira rodada de medidas para responder à revolta agrária, incluindo maior controle da origem dos produtos, ajuda ao setor pecuário e a suspensão temporária de um plano para reduzir o uso de pesticidas.

Mas este apelo surge quando os protestos ultrapassaram as fronteiras da segunda economia da União Europeia e se espalharam por outros países como Itália, Portugal e Grécia, à espera que os agricultores espanhóis entrassem em cena nas “próximas semanas”.

Em Bruxelas, milhares de manifestantes acompanhados de “mil tratores e máquinas agrícolas” tomaram várias avenidas da capital belga, deixando cenas de tensão, por ocasião de uma cúpula dos líderes dos 27 países da UE, informou a polícia da Bélgica.

“A revogação do ‘pousio’ é uma migalha. Não resolve o problema. Queremos renda (…). Queremos viver do nosso trabalho!”, disse à AFP Pierre Sansdrap, um criador de gado belga, diante de uma longa fila de maquinaria agrícola nas ruas de Bruxelas.

Sansdrap refere-se à proposta da Comissão Europeia de revogar parcialmente em 2024 a obrigação de deixar 4% das terras aráveis em “pousio”, tal como estabelecido pela nova Política Agrícola Comum (PAC), um pilar da ajuda europeia ao setor.

O Executivo comunitário anunciou também que irá estudar um mecanismo para limitar as importações da Ucrânia, especialmente de aves, mas estas concessões ainda não convenceram o setor ou os sindicatos agrícolas na França.

“Ao mesmo tempo, nos questionamos sobre a surdez da Europa”, disse o líder da FNSEA, referindo-se à “crescente incompreensão entre uma tecnoestrutura entre os muros dos seus escritórios em Bruxelas e as realidades” no campo europeu.

 

Oposição “firme” ao acordo UE-Mercosul

Embora em situações diferentes, as mesmas queixas ressoam na maioria dos países: uma política da UE muito complexa, rendas muito baixas, inflação, concorrência estrangeira, acúmulo de normas…

Um dos principais pontos de tensão é o acordo que a UE e o bloco sul-americano do Mercosul negociam há mais de 20 anos e que, segundo os agricultores, representaria um grave revés para este setor na Europa.

“A França não vai aceitar este tratado. Isso é claro, inequívoco e firme”, assegurou Attal, apesar de a poderosa associação patronal francesa Medef ter dito que era a favor do acordo com Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai.

Embora os protestos não estivessem na agenda da cúpula de Bruxelas, o presidente francês, Emmanuel Macron, discutiu “o futuro da agricultura europeia” com a chefe da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, segundo a Presidência.

O governo francês multiplicou os seus esforços, especialmente quando os protestos se intensificaram no dia anterior com a prisão de cerca de 100 agricultores por invadirem o mercado atacadista de Rungis, fundamental para a alimentação em Paris.

O plano apresentado nesta quinta-feira procura “reconhecer melhor a profissão do agricultor, restaurar as rendas” e “proteger contra a concorrência desleal” e inclui mais de 10.000 controles sobre a origem francesa dos produtos.

Paris destinará 150 milhões de euros (162 milhões de dólares ou 802 milhões de reais na cotação atual) para ajuda aos pecuaristas, suspenderá temporariamente um plano de redução de pesticidas e proibirá a importação de vegetais e frutas tratados com o inseticida tiaclopride, entre outras medidas.

Enquanto aguardam a reação dos outros sindicatos que bloquearam durante duas semanas importantes estradas na França, os principais centros já avisaram que permanecerão vigilantes e que aguardam os resultados do governo, tendo em vista o Salão Agrícola Internacional, um evento anual para o setor que abre suas portas em Paris no dia 24 de fevereiro.

 

Fonte: AFP
Foto: Sameer Al-Doumy/AFP